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Por que podemos doar mais – e melhor

Rio de JaneiroSão Paulo

Luiza Serpa

“Há quem alegue não conseguir escolher uma ONG para a qual doar dinheiro, com medo de que ela não seja idônea. Eu digo: ‘Escolha com o mesmo rigor usado para contratar o CEO da sua empresa”. A frase é do médico e filantropo José Luiz Egydio Setúbal, um dos herdeiros do Itaú, e foi dita em entrevista recente para a Revista Veja. Quando li, me perguntei se ele trabalhava escondido dentro de alguma gaveta no Instituto Phi.

Desde 2012, respiro o tema doação diariamente – passo meu tempo tentando criar mecanismos, métodos, ferramentas de comunicação, eventos e ações para aproximar as pessoas desse tema e, consequentemente, aproximá-las delas mesmas e do lugar onde moram. Como criar esse senso de comunidade em cada um? Como aumentar a confiança que dizemos faltar?

Setúbal, que está à frente de projetos filantrópicos na área da saúde, recentemente tentou criar no Brasil um movimento similar ao The Giving Pledge, fundado por Bill Gates e Warren Buf­fett. Ao seu lado, estava o empresário Elie Horn (fundador da construtora Cyrela), que já faz parte do The Giving Pledge. Queriam incentivar milionários brasileiros a doar 20% de sua fortuna. Não conseguiram convencer ninguém.

A desigualdade de renda no Brasil vem crescendo e atingiu, no primeiro semestre de 2019, o maior patamar já registrado. Segundo pesquisa divulgada semana passada pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/IBRE), o índice que avalia o nível de desigualdade sobe consecutivamente desde 2015 e, em março deste ano, atingiu 0,6257 – numa escala de 0 a 1, quanto mais próximo do 1, maior é a desigualdade.  Por fim, desde 2012, a renda acumulada dos mais ricos aumentou 8,5%, enquanto a dos mais pobres caiu 14%.


Retrato da desigualdade: favela de Paraisópolis ao lado do vizinho rico, o Morumbi /Shutterstock

Concordo totalmente quando Setúbal diz que inventamos desculpas o tempo todo para não doar, e não falo só de dinheiro; falo de tempo, de interesse por algum tema. Na entrevista, o filantropo destaca que muitos ricos alegam que “não conseguem escolher uma ONG com medo de que ela não seja idônea”. Pois eu digo que existe o Phi e várias outras organizações que podem guiar investidores sociais para que façam boas escolhas e acompanhem os resultados.

Participo de diversos grupos que me fazem acreditar que, juntos, podemos resolver nossos problemas sociais. Temos inteligência e tecnologia para isso. O que nos impede? Por que é tão difícil para as pessoas mais ricas doarem mais, de forma recorrente e comprometida com uma determinada causa?

Na última semana, me perguntaram: o que fazer com R$ 2 milhões no Rio de Janeiro? Distribuir os recursos para diferentes projetos? Eu sugeriria que não. Escolha o problema que quer resolver, entenda ele com profundidade, se comprometa e ataque.

O cobertor é muito curto no Brasil. A sociedade precisa se organizar. E se importar com o outro é um caminho sem volta – quando você começa a enxergar o que acontece ao redor, não consegue mais parar. Mas o primeiro passo é observar seus valores e motivações e acreditar: filantropia é amor à humanidade.

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